domingo, 8 de junho de 2008

Silvo a Alcyone

pela incertitude palavra pune
faz do talhe vômito, da forma estrume

os labirintos atirados às costas são alçadas das asas
sob a face gloriosa da chama libertas viram
a cidade a pique nos seus fédores
cairiam de joelhos se ainda houvessem pernas saindo do pescoço
osso oco, res posta à mesa formularam hematoma
co-sabores de carne dilacerada não pelas mãos
libelo lá não há, veria por menos de centelha

as uranianas baiavam para vanecer detrás do cinturão do ferido
círculo em giz marcado terreio promontório do cal caso



cruza-o


as marés nada sabem de pontes
letras são tipos de caixas visíveis
onde guardam-se os sons, Betel Hé Tau Vau Iód
às quais envideiam as palavras, frágeis por seu tamanho excessivo e prisão humana significada
ao xofre bebedoria em coluna obposta à mér curial ança
sal, o manto das correntes marteriais desfez o muro de contas

arrancar sete becas não bastariam
para a desnudez do vidro
quem se prende aos ponteios sob o temor às 18:30
Shin, ifus isaínas lembra o sabor da doença
só, deus posto no cú da cobra prima

busca então abrigo no centro da rota
esquece que a dama do lago nada pode, otar
refere ao lexo a espada presa à pedra do redemoinho,
não haveriam de coagular o feitiço com a fé, arot
nove jóias desdobradas numa got
indigestão de suas ganas e ânsias
prismado do recentio, recanto das auroras
esporos aos poros, esporas e esporras
martírio e centeio, you're so so so so sirius!

não há portos através dos portais
a mensagem é a garrafa, era are
ars terratio nebula, pó erguendo da terra batida
por pöe reis quatro gárgulas estupram rinthra
sob a pele escamoteada dos campos no teto

o cristal aprende a forma da transparência na pressão das profundezas
pelo inforço palavra transmuta carne em nervos músculos armas em lamas malas,
hitmo mór há mar

são as moscas advindas do aroma de teu sangue exposto
envaidecidas pelas miríades cristálidas de trás dos suóres cór têxtil
a se atirar em direção ao éter que envolve teus olvidos
pés naufragados sob flechas, não é violência a latência
dos pulsos severos, o literal bruto é passivo frente ao grito tácito
a corte abrupta do somnio alicerçada no ícone escatológico táctil

mugindo leite de porra a vaca desleixada pisoteia a carcaça do leopardo
como fizera antes com o tigre e a pantera
invencida, pois derrota pelo lampejo da semeadura do futuro na memória raciante
nove fonias em sýn por uma alegria, duas mortes, três ilusões nas escadarias
Flöerflüsserkantorpyrosbach, rio de chamas em flamas

serias um bom home, ainda houvessem homens
todos os encaminhos levam à mesma perdição
subir alvo almejar só para render-se peranto torque

no puteiro onde conheci quatorze putas doentes no oriente
famélicas pelo contágio das cabeças carecas de garras aglutinadas ao ocidente
todas em dança geométrica às dinâmicas se prostavam a harmonia
esta se punha de cú pro sol secando suas graciosas hemorróidas

loglaheliopoiesis... galo noturno, corvoz e colhibrio sob o olhar de mar lei
ditaram
sobrevivência barrosa às feras pela ensenhança de carregar vermes ao bico
o pasto antecede a mata para a boca não à pataca
sete vezes sete gerações mastigaram os próprios dentes
por saber o tamanho ideal da pedra
a carregar-se em larga palma com firme pulso
pimenta por sob as unhas, barulho e poluítica
voz antecede o veneno à língua
a droga perfeita, agora, nos deseja
cisca gorgeios pragmáticos nos vestíbulos da burocracia

fomento e a loteria das cabeças infladas por quiabo e páprica
à marcha dos objetos, um buda com coração de cristo e chifres faunos
:o mundo alegre e mundano vai demonstrar sua raiva enfim
anunaki e as prateleira de nibirus, este dilúvio será de luz
treze cavalos de fogo circundam a siriema aquosa
nunca encontraram uma só cobra em seu estômago
digeriu pelo canto a impossível curva
brasa fez-se, fênrix lúpolo
por oxumaré ribeiro

domingo, 1 de junho de 2008

O ato de criação: uma aposta ético-política para a vida comunitária

Texto de Annabel Teles, 10 de dezembro de 2007 – inauguração do Museo de la Memória Montevideo, Uruguay

Tradução por Daniel Avila

I

Em primeiro lugar, quero agradecer a Alba Platero, aos organizadores deste evento, o convite para participar desta mesa que me brinda com a possibilidade de compartilhar com todos vocês este momento inaugural. Aqui, neste lugar onde se aninham tantas dobras penosas de nossa memória, onde novamente, neste espaço, se afirma a vida.

A convocatória deste evento nos força a pensar neste tempo e lugar. A pensar o presente e as transformações que nele ocorrem, a pensar a memória. Pensar o presente não significa fazer uma descrição dos fatos, do atual estado das coisas, significa iluminar os signos do devir que expressam a emergência de múltiplas mutações, que trazem consigo a possibilidade de sermos diferentes daquilo que somos.

Tornar a pensar a memória adquire relevância. A memória nos coletiviza, ilumina os vínculos entre os seres. Nos brinda com a possibilidade de experimentar as tramas relacionais, os acontecimentos que povoam o mundo e constituem nossas vidas. Não é questão de idade, a memória insiste ainda nos mais jovens. Em cada um dobra-se de um modo singular, assinala o rumo por onde caminhar para alcançar as tramas afetivas que são a condição para o desdobrar de uma vida renovada.

Pensar a memória coletiva, pensar a própria memória, significa encarar nossa vida atual, pensar seu sentido e valor. Pensar, também os percursos efetuados e as afirmações realizadas.

Nos dias anteriores, quando comecei a escrever este texto, apresentaram-se a mim muitas imagens, palavras, gestos fugazes. Junto a ele, lentamente impôs-se a pergunta pelo sentidos das buscas, das ânsias, da tenaz insistência de tantos de nós em encontrar, mediante o pensamento e a ação, as veredas que nos conduziriam a territórios de liberdade e justiça pelos quais havíamos lutado em nossa juventude.

Nesses dias, me despertou a sensação desse desejo que me empurrou para frente durante os trinta anos em que vivi na Argentina. Essa ânsia que me obrigou a estudar, a investigar, a transmitir aos outros que não existem ruelas sem saída, que os desejos de transformação ainda têm vigência, que não são exclusivos de uma geração, de uma época e tampouco formam parte de um passado irrevogável.

A história das idéias, sua genealogia, me deu pistas de que antes, muitos antes de nós, houveram outros que buscaram, de diferentes modos, os caminhos que conduziram a outros modos do mundo, onde fosse possível relações libertárias e amorosas entre as pessoas.

A memória, sem dúvida, guarda em si um potencial emancipatório, enriquece o presente, atualiza o passado e dá lugar ao futuro.

II

A preparação deste texto ajudou-me a compreender profundamente o sentido de tantos anos de ensino e investigação filosófica onde a preocupação foi a de trabalhar esta difícil relação entre a filosofia e a vida, entre o pensamento e a produção – digo produção em um sentido amplo que inclue a criação artística, mas que não deixa de lado a produção material, nem as distintas modalidades produtivas que realizam os seres humanos.

Pude vislumbrar que esse pertinaz desejo de pensar o acontecimento, o que passa e nos passa, era um modo de tentar pensar a construção coletiva de novos modos de vida, nos quais fosse possível integrar aqueles que sempre culminam em ficar de fora.

Os fragmentos do passado nos esvoaçam, insistem. Nossos desejos formam parte de uma memória coletiva que adquire corpo, consistência. As experiências vividas aqui, nesse território, adotam novos sentidos, fazem-nos inverter o olhar, escutar as vozes de outros tempos, aquelas que ressaltam caminhadas singulares.

Os relatos das experiências vividas ressoam em nós. A recordação dos contos que minha mãe evocava de suas viagens pelo interior do país, junto a outros professores nas missões pedagógicas, me abriu uma nova perspectiva. A memória destas experiências me deu as pistas para pensar que o ensino não se limita às aulas, que o exercício do pensamento e a arte não são exclusivos das formas estabelecidas. Notei que hoje era importante escutar os desejos de criação daqueles professores, de minha mãe que em uma escola do povoado de Sauce, no departamento de Lavalleja, semeou as sementes para a criação de uma comunidade educativa, artística e produtiva.

Os fragmentos da memória compõe-se e decompõe-se. Dizem-nos sobre as lutas de homens e mulheres, de épocas de opressão, de perseguições, de torturas e assassinatos. Dizem-nos as tramas afetivas nas quais vivemos, pensamos e agimos; do presente e da transformação. Dizem-nos, também, de desejos éticos e políticos de outros modos do mundo.

III

Como, e até onde, é possível pensar diferente? [1] A pergunta de Foucault formulada no campo da filosofia tem sido uma guia do pensamento para muitos de nós. Ela insiste em nossos dias, orienta o pensamento filosófico, despeja um novo-antigo caminho. A filosofia não se limita a legitimar o conhecimento e assegurar a ação, abandona a vontade de verdade como seu único propósito.

O pensamento filosófico que se realiza com relação à vida, aos acontecimentos que a povoam, expressa uma preocupação por aquilo que passa e nos passa; abre uma fissura no presente, dá lugar ao novo, ao que se distingue do estado de coisas vigente; ilumina os sinais da transformação.

Os problemas filosóficos são problemas vitais, dizem respeito aos homens, às mulheres, ao mundo. Os problemas trazem consigo focos intensivos, urgências, aprisionamentos das forças vitais que produzem fissuras por onde introduz-se a potência mutante do devir. Formular problemas e compreendê-los exige abrir-se às sensações, às intensidades que nos percorrem e nos atravessam, às dimensões afetivas que constituem a vida dos seres e do mundo.

A filosofia converte-se em um ethos [2], uma atitude que suporta um modo de relação com o mundo, com os demais e consigo mesmo. A filosofia recobra seu vigor, diz os acontecimentos, dá conta de seu sentidos e de seu valor, estimula a afirmação de um pensamento ético-político como exercício de liberdade.

IV

A relação da filosofia com a arte tem sido delicada desde os tempos de Platão. Na trilha de Nietzsche e de alguns de seus antecessores, Gilles Deleuze, filósofo francês contemporâneo, formula uma relação intrínseca entre a filosofia e a arte. Com relação à pintura nos diz que a filosofia espera algo que só a pintura pode lhe dar. A pintura impõe um raio luminoso sobre os conceitos filosóficos[3]. Segundo ele a filosofia é uma atividade essencialmente criativa, cria conceitos. Seu trabalho de elaboração conceitual a aproxima da arte, cria conceitos filosóficos em relação à arte. Em alguns de seus textos nos deparamos com idéias interessantes para o momento de pensar a relação entre arte e política. Tomarei aqui quatro idéias que podem contribuir nesse sentido.

Primeira

Nessa sintonia, a pintura de diagrama torna-se um conceito lógico, filosófico, que guarda uma relação privilegiada com a pintura. A noção de diagrama pictórico põe em relação necessária duas idéias, a idéia de caos e a de gérmen. O diagrama é considerado como um caos do qual emana algo: um caos presente sobre a tela para que algo salte dela. O diagrama desfaz a representação e faz surgir a presença. Mediante o caos se desfazem os acontecimentos formais, o já dado, para dar lugar ao novo. [4]

Segunda

O ato de criação expressa necessariedade, a criação está impregnada de necessidade. Um criador não é um ser que trabalha por prazer. Um criador não faz mais que aquilo do qual tem absoluta necessidade[5].

Terceira

O ato de criação devém um ato de resistência. Deleuze nos diz, de modo radical, que a obra de arte não é um instrumento de comunicação, ela não contém informação. A informação é o sistema controlado das palavras de ordem que têm lugar em uma sociedade dada [6]. Segundo ele é preciso uma desobediência permanente ao sistema de controle que dita no que temos que acreditar, fazer e dizer. A desobediência ao sistema de controle somente se efetua quando a contra-informação torna-se um ato de resistência. A obra de arte enquanto ato de criação é um ato de resistência.

Quarto

Cito Deleuze: Só o ato de resistência resiste à morte, seja sob a forma da obra de arte, seja sob a forma de uma luta dos homens. E que relação misteriosa há entre a luta dos homens e a obra de arte: A relação mais estreita e, para mim, a mais misteriosa.

É exatamente isso que queria dizer Paul Klee quando dizia: “Vocês sabem, falta o povo” (...) esta afinidade fundamental entre a obra de arte e um povo que ainda não existe, não é nem será clara, jamais. Não há obra de arte que não faça um chamado a um povo que não existe, ainda.


V

A relação entre a arte e a política formula-se sobre a afirmação de que o povo falta, ele não existe ainda..., não está dado e é preciso inventá-lo toda vez [7]. O povo não se refere a um suposto povo, tampouco à saudade por um povo lendário, mas ao modo de contribuir à invenção de infinidades de povos por vir, dinâmicos, mutantes, comunidades capazes de dar lugar a novos modos de vida.

O pensamento político, em sua relação com a arte e a filosofia, sofre uma transformação. O conceito de diagrama, caos-gérmen, afirma a dissolução da rigidez própria das formas estabelecidas, dá lugar a uma modalidade diferente, a uma presença direta da vida, da criação no político.

O conceito de diagrama comporta uma lógica temporal, mutacional, que estimula a emergência de atos de resistência que levam em si o gérmen da criação. O ato de criação torna-se necessário, expande a potência criadora singular do artista, como expressão da potência criadora do mundo. Nesse sentido, artista será todo aquele que, graças a uma imersão no jogo relacional da vida, a uma intensificação da relação com os demais e com o mundo, alcança uma afirmação singular e necessária de sua potência criadora.

VI

Neste momento, gostaria de fazer uma breve menção ao pensamento de Espinosa, filósofo do século XVII para enriquecer a relação entre política, arte e filosofia, já que seu pensamento está subjacente na formulação ético-política que estamos realizando.

Deleuze lê Espinosa e Nietzsche. Para ele ambos guardam um vínculo muito estreito e configuram um plano de pensamento singular no que se desdobra a potência criadora como potência-ser. O ser define-se em sua potência de existir e de produzir. As considerações da potência, da produtividade, da criação, nos remetem à ontologia, ao pensamento do ser, à pergunta pela realidade.

No que se refere à política, o peculiar do pensamento de Espinosa é que a política se une à ética e à ontologia. O pensamento que concebe o Ser é o mesmo que anima a ética e a constituição prática da organização política.

Nesta perspectiva o problema ético-político fundamental é “como ser livre?”, “como gerar as melhores condições para efetuar a potência produtiva?”, “como realizar um exercício de liberdade capaz de enlaçar o desejo e a criação?” A proposta político-social de Espinosa seria como gerar as condições para a apropriação, aumento e expansão da potência criadora dos homens e mulheres.

VII

No momento de concluir as perguntas multiplicam-se. Como devir seres produtivos capazes de exercer sua potência-desejo de criação; como gerar as melhores condições para o desdobrar de processos criativos; como gerar um plano de pensamento e produção onde se elaborem estas questões e, assim, atenda-se os problemas ao nível do trabalho, a alimentação, a saúde e a moradia das pessoas.

Talvez voltar-se à nossa memória nos permita abordá-las de uma perspectiva diferente da habitual. Talvez isso nos anime a gerar instâncias de vida coletiva onde a arte, a filosofia, a ciência abandonem a exclusividade das aulas, ganhem as ruas, o solo da terra, desdobrem-se junto às árvores e aos rios. Onde os saberes e as práticas produtivas contribuam, mediante investigações inovadoras, à formação de comunidades educativas, artísticas e produtivas

Nesse contexto a arte, ao assumir seu potencial metamórfico, ao expandir e efetuar, mediante seu exercício específico, a potência criadora dos seres, realiza uma aposta ético-política capaz de desdobrar relações libertárias, de composição e alegria.

Bibliografía

Foucault, M., El uso de los placeres, Historia de la sexualidad II, Siglo XXI, México 1988.

Deleuze, G., Guattari, F., ¿Qué es la filosofía?, Anagrama, Barcelona, 1993.

Deleuze, G., Nietzsche y la filosofía, Anagrama, Barcelona, 1993.

Deleuze, G., Pintura. El concepto de diagrama, Cactus, Buenos Aires, 2007.

Deleuze, G., La imagen- tiempo, Estudio sobre cine 2, Paidós, Barcelona, 1984.

Deleuze, G., En medio de Spinoza, Cactus, Buenos, Aires,

Deleuze, G., Spinoza y el problema de la expresión, Muchnik, Barcelona, 1975.

Deleuze, G., ¿Qué es el acto de creación? Conferencia dada en la cátedra de los martes de la fundación FEMIS, 1987-http://www.dialogica.com.ar

Foucault emplea este término en “Qu’est-ce que les Lumières?”, en Foucault, M., Dits et écrits, vol. IV, Gallimard, París, 1994, p. 577.

[1] Foucault, M., El uso de los placeres, Historia de la sexualidad II, Siglo XXI, México 1988.

[2] Foucault emplea este término en “Qu’est-ce que les Lumières?”, en Foucault, M., Dits et écrits, vol. IV, Gallimard, París, 1994, p. 577.

[3] Deleuze, G., Pintura. El concepto de diagrama, Cactus, Buenos Aires, 2007, p. 22

[4] Op. cit., p. 91

[5] Deleuze, G., ¿Qué es el acto de creación? Conferencia dada en la cátedra de los martes de la fundación FEMIS.

[6] Op. Cit.

[7] Deleuze, G., La imagen- tiempo, Estudio sobre cine 2, Paidós, Barcelona, 1984, p. 286 ss